O Clube Fenianos Portuenses Uma das coisas de que gosto mais sobre o meu tempo no Porto é que andar pela cidade é como abrir uma caixa de surpresas. Segue-se uma rua estreita medieval que quase não permite a passagem de um carro, só para se descobrir que ela dá para uma praça espaçosa com senhoras a discutir as notícias do dia ou senhores a jogar dominó. Nas partes mais antigas da cidade, um olhar superficial mostra os edifícios velhos e delapidados, janelas onde está pendurada a roupa a enxugar. Porém, uma vista de olhos mais cuidadosa revela as fachadas revestidas de azulejos coloridos e outros pormenores arquitectónicos que informam o visitante como eram esses bairros outrora. E assim desta maneira, fui aprendendo sobre a história das ruas e dos edifícios que vi ao meu redor... Ouvi falar do Clube Fenianos Portuenses durante uma conversa com dois senhores que me estavam a contar sobre o Cinema Águia d’Ouro e a Praça Batalha. Ao saber que no café ou no restaurante em que se reuniam os sócios foi o primeiro lugar em que as mulheres podiam fumar em público, fiquei interessada em aprender mais sobre este espaço aparentemente liberal das primeiras décadas do século XX. Quase um mês depois, reparei uma bandeirola pendurada da fachada de um edifício ao lado da Câmara Municipal que comemorava o centésimo aniversário do Clube Fenianos Portuenses. Fui lá para ver se podia descobrir mais sobre o Clube e o Cinema. Apresentei-me ao porteiro, Manuel Pinheiro, que também era sócio do Clube, e disse-lhe o que estava a pesquisar. Fiquei tão surpreendida e contente quando a conversa espontânea tornou-se uma entrevista sobre o movimento republicano ao início do século XX e o passado carnavalesco do Porto. Segundo sr. Pinheiro, o Clube Fenianos Portuenses era e é o único clube do seu género, fundado em 1904. Originalmente composto de republicanos contra a monarquia, os sócios do Clube reuniam-se no Cinema Águia d’Ouro até os anos 20 ou 30, quando mudou para a sede actual na Avenida dos Aliados. Embora hoje se permitam como sócio as mulheres tanto como os homens e qualquer pessoa independente da sua convicção política (até os monarquistas, se ainda há!), antigamente era o local para os liberais e os republicanos portuenses. Isso fez com que o Clube fosse o alvo de muito antipatia dos monarquistas e, mais tarde, da ditadura militar. Sr. Pinheiro contou-me que o Clube, quando se situava no Águia d’Ouro, foi vítima de um atentado bombista na altura em que a antipatia entre os republicanos e os monarquistas chegavam ao seu auge, mas não consegui achar informações nos textos históricos que consultei para corroborar isso. Também me disse que, na altura da ditadura, os sócios tiveram de tomar muito cuidade quanto às suas actividades e atitudes por causa dos membros que apoiavam o regime e poderiam ser também informadores. O motivo principal da fundação do Clube, segundo a Câmara Municipal do Porto no seu site, “História das Ruas” foi o de incentivar o renascimento do entrudo portuense.107 A organização e o patrocínio do carnaval do Porto manteve-se no decorrer do tempo mas se dedicou também à filantropia e à beneficência. Hoje, o Clube é composto primariamete de pessoas da classe média, muitos deles sendo donos de empresas pequenas e medianas. Sr. Pinheiro lamentou-me que o número dos sócios jovens (entre 20 e 40 de idade) tem baixado de forma considerável nos últimos anos, porque, segundo ele, «o sentido de bairrismo» na cidade já não é como era. Quanto à minha pergunta inicial sobre o Clube sendo o primeiro lugar onde as mulheres podiam fumar publicamente, Sr. Pinheiro não teve a certeza se isso foi a verdade. Mas, ele disse-me, era provável que as mulheres fumavam lá, dado que era um clube liberal.
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Notas 107 "História das Ruas," Câmara Municipal do Porto <http://www.cm-porto.pt/pagegen.asp?SYS_PAGE_ID=457630&id=642> |